segunda-feira, 2 de maio de 2016

Economia brasileira contemporânea


A discussão deste tema é tarefa complicada e exige exame de dados mais precisos sobre o momento dramático por que passa a economia brasileira. Por mais difíceis que possam parecer, estas aventuras pelo mundo das finanças são indispensáveis para a formação cidadã e a postura crítica. As paixões políticas são determinantes para a falta de conhecimento da realidade econômica e, muito pior, desvirtuam o olhar do cidadão para os reais fatores que impulsionam o desenvolvimento do País. 
O risco de incorrer em erro é muito grande, mas deixar a volatilidade das palavras e trilhar o caminho da escrita é método seguro para uma formação sólida e crítica. Por tal razão, tomo a iniciativa de fazer registros escritos dos avanços e retrocessos que possa enfrentar em temas tão candentes. É mais produtivo errar escrevendo do que perder-se em verbalizações, muitas vezes, contraditórias e apressadas. O silêncio e a reflexão conduzem a escrita, as paixões e as posturas ideológicas estabelecem coesões de pensamento nem sempre coerentes.
Este primeiro tema é desafiador e polêmico, pois externar uma posição sobre o quadro da economia brasileira na atualidade é enfrentar discursos contaminados por ideologias de todos os matizes. Chegar a uma postura crítica, isenta de crenças já estratificadas, é um objetivo ambicioso e fundamental para a formação acadêmica. Talvez, aqui, possamos estar diante de uma das vantagens do desconhecimento, ou seja, a construção de um novo saber, livre de posturas contaminadas por posicionamentos político-ideológicos, estranhos aos objetivos da economia.

- 3,8% do PIB
A nossa discussão inicia com um título expresso em números: -3,8 do PIB em 2015! Apesar das discussões acaloradas sobre o valor deste índice, ele mantém-se como um indicador confiável da saúde econômica de um país ou região. O importante é destacar que o PIB não é um número absoluto, mas está atrelado a diversos outros fatores que determinam a aceleração ou desaceleração da economia. Levando em consideração este fato, ele deve ser analisado sob dois aspectos: primeiro em seu percurso histórico e, segundo, em relação aos fatores que implicam a sua composição. Só após a análise detalhada destes elementos é que podemos avaliar a extensão e a profundidade da crise no momento.
A avaliação do PIB, no Brasil, começou a ser feita no ano de 1948, portanto dentro do esforço de pós-guerra com a visão macroeconômica keynesiana, sob forte influência dos princípios estabelecidos em Bretton Woods (New Hampshire – 1944), que resultaram na criação do FMI e do Banco Mundial. O sentido maior é medir o volume da economia do país a fim de determinar as melhores políticas públicas para o desenvolvimento. Prevendo o final da Segunda Guerra, os países passam a buscar soluções para o restabelecimento das suas economias e para o conserto dos estragos produzidos pelo conflito. 
O Brasil já passou por momentos de forte desaceleração da economia e já tivemos índices negativos até maiores do que o atual, mas o contexto social é bastante diferenciado em cada situação. A economia vive em constante conflito entre ciclos de fartura e de carência, como resultado de um conjunto de fatores intervenientes. Vamos examinar, primeiro, os extremos observando sua evolução e persistência.
O governo João Goulart teve seu ponto mais alto em 1962, quando atingiu o índice de 6,2%. A grave crise política que se desenvolveu em 1963, fez com que o PIB despencasse para 0,6%, mas ainda dentro do espectro positivo. O período que vai de 1964 a 1984, regime militar, o PIB manteve-se bastante estável, atingindo o maior índice no ano de 1972 com mais de 10% (Médici – 1969-1974). O pior desempenho foi o de Figueiredo com -4,3% no ano de 1981.
Após este ciclo da ditadura militar, o governo de José Sarney (1985-1990) enfrenta turbulências econômicas muito grandes, como a crise do petróleo, mas consegue manter-se entre 7,8% em 1985 e 0,1% em 1988. O presidente Fernando Collor (1990-1992), primeiro eleito diretamente após o ciclo militar, teve um desempenho pífio, com 4,3% em 1990 e 0,5% em 1992. Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) teve o melhor desempenho em 2002 com 5,9% e o pior em 1998 com 0,3%. O governo Lula tem o pior desempenho em 2003 com -0,1% e atinge o máximo em 2010 com 7,5%.
Dilma (2011 - atual) recebe país com o PIB em torno de 4%. Tem seu melhor desempenho em 2011 com 3,9%, em 2012 cai para 2,7%, em 2013 passa para 2,3% e em 2014 0,1%. Esta sequência de redução da economia, resulta no índice de -3,8% de 2015.
Nesta perspectiva histórica, o importante de observar é que, embora o governo Dilma tenha atingido -3,8%, ele não é o pior, pois tivemos -4,3% no governo de João Figueiredo. O que preocupa, no caso Dilma, é o índice manter-se em queda por três anos consecutivos. Este desempenho decadente abala profundamente a confiança do mercado e torna-se dramático no momento em que o próprio governo não encontra solução a curto prazo para reverter a situação, levando as projeções para nova queda em 2016.
Olhar apenas para o PIB não traz ao leitor uma visão correta da situação econômica do país, pois ele é uma medida muito ampla da macroeconomia e, por outro lado, não é elemento determinante, mas determinado pelos fatores que compõem a economia real. O principal problema do PIB é não representar o desenvolvimento da região. Como diz Adam Smith: “A riqueza de uma nação se mede pela riqueza do povo (....)” A quantidade de índices econômicos torna confusa a mente de qualquer pessoa, como eu, que não seja especialista na área, por esta razão farei uma seleção de alguns indicadores mais conhecidos e que trazem argumentos de mais fácil compreensão. Fatores que podem influir no desempenho do PIB são diversos, mas vamo-nos guiar pelas justificativas apresentadas pelo próprio governo para a situação atual.
Um primeiro argumento é o quadro internacional o que não justifica, mas pelo contrário expõe um dado interessante. O Brasil está numa posição incômoda, tendo por vizinhos de PIB a Grécia, Rússia, Ucrânia e Venezuela. Por outro lado, países latinos como Peru, Paraguai Bolívia e México conseguem manter PIB positivo. O Brasil tem desempenho comparável ao da Grécia que vem em recessão há tempo, bem como Rússia e Ucrânia, mergulhados em crise regional. Por outro lado, só obtém desempenho melhor do que o da Venezuela, o país líder do bolivarianismo. Como fator internacional, pode ser apontada a política externa brasileira que privilegiou, nos últimos anos, o comércio com países de esquerda, deixando de lado velhos parceiros comerciais. No sentido oposto, o Chile manteve comercio com parceiros tradicionais e conseguiu crescimento do PIB em 2015, 1,9%. A crise mais recente, a de 2008, teve sobre o Brasil um impacto menor, a ponto de ser chamada, pelo governo, de “marolinha”. Realmente, 2008 tivemos desempenho positivo em torno de 4%, mas 2009 mostrou recuperação atingindo mais de 7%. Conclui-se que são fatores internos que prejudicam o Brasil, e não a economia global, como apregoa o governo.
O governo Lula herdou estabilidade social, política e econômica e as manteve por algum tempo. Com acertos e erros, construiu dois períodos de governo com avanços sociais, mantendo controle sobre a economia. Dilma recebe o governo com PIB positivo, mas inicia uma série de descontroles que resulta no desastrado índice de -3,8%. Todos indicadores apontam para fatores internos como causa da situação. As agências de risco S&P, Fitch e Moody’s apontam para a crise política como o fator que mais agrava a credibilidade da política econômica brasileira. Em suma, em vez de buscar no exterior as causas do fracasso, o governo deveria olhar para seu interior e solucionar as próprias contradições.
Não se pode encerrar esta análise sem um exame de mais alguns indicadores que fundamentam a avaliação do PIB, como INPC e IPCA; Pnad; Taxa Selic e, por fim, a Produção industrial. O exame que segue é um pequeno exercício que examina o ciclo de recessão em que o País está, levando em consideração apenas a relação entre retração de consumo e produção industrial como fatores componentes do desemprego.
INPC – Este índice é importante porque atinge as famílias com renda até cinco salários mínimos, portanto atinge a classe econômica que é considerada meta principal do governo. Janeiro de 2016 apontou para 11,31%, como resultado de uma crescente alta desde janeiro de 2015.
IPCA – O cálculo deste índice é feito sobre a faixa salarial de um a quarenta salários mínimos o que abrange uma camada mais ampla da sociedade. Janeiro de 2016 apresentou 10,71% de crescimento. Oficialmente, este índice é utilizado para indicar a inflação anual.
Estes dois indicadores fornecem parâmetro para consumo, pois quando elevados, eles inibem o consumidor. Em 2002, no governo Fernando Henrique, a contenção de salários aliada à inflação levou o IPCA à 12,53%. No governo Lula (2003-2010) este quadro foi revertido, atingindo o patamar mínimo de 3,14% no ano de 2006. Durante o governo Dilma (2011-atual), estes índices tendem a crescer continuamente o que faz com que a população diminua o consumo.
PNAD – Este é um dos índices mais reveladores, pois mede a taxa de desemprego. Desde janeiro de 2015 a taxa de desemprego só aumenta, atingindo o nível de 7,6% em janeiro e 10% em abril deste ano. Este índice só é menor em relação ao ano de 2009 (8,2%), em plena crise mundial de 2008. Desempregado, ou preocupado com a manutenção do emprego, o trabalhador não gasta, portanto, a indústria não vende e aproxima-se o fantasma da crise econômica.
A relação entre desemprego e produção industrial é resumida por Ailton Guimarães:
No que se refere a manutenção de altas taxas de desemprego, estas não devem ser creditadas somente a política econômica, principal causadora do baixo crescimento do PIB e a apreciação do câmbio. Neste último caso, temos um dos motivos para o processo de desindustrialização com a consequente perda de emprego no setor industrial. Os outros motivos seriam o fenômeno denominado doença holandesa[1] e as mudanças estruturais das empresas devido ao aumento da competitividade no comércio mundial. (GUIMARÃES: sd, p. 92)
Taxa SELIC – Este indicador é o regulador dos juros dentro da economia brasileira. É um indicador complexo e com muitas variáveis, mas simples como controle de empréstimos no setor bancário. A taxa Selic fecha as portas para o empresário em dificuldade, assim levando à falência amplos setores da indústria e do comércio. Não se pode deixar de ressaltar que o aumento da Selic implica aumento da dívida pública, tornando a situação mais dramática. A equação entre taxa de juros, inflação e consumo é ponto crucial para o controle da economia do país.
Produção industrial – A força econômica, competitiva, do país depende de sua indústria. O mês de janeiro de 2016 apresentou uma ligeira recuperação (0,4%), interrompendo um ciclo de queda desde junho de 2015. Tomando um longo prazo, ou seja, janeiro de 2015 a janeiro de 2016 a indústria recuou -13,8%. Este desempenho negativo não pode ser revertido a curto prazo, pois o aumento da produção depende de diversos fatores, como aumento de consumo e investimentos, tanto em maquinários como em produtos.
Este quadro desolador encerra alguns fatores que são oriundos de setores que estão fora da economia, embora tenham influência decisiva na sua condução. A credibilidade do governo e a segurança jurídica parecem ser elementos decisivos no momento atual. Lula passou para o mercado uma mensagem de continuidade da política econômica com a manutenção de Henrique Meirelles para o comando do Banco Central (2003-2010). Por outro lado, Lula sinaliza para o mercado uma tendência política, ao indicar para o Ministério da Fazenda o médico e militante petista Antônio Palocci (2003-2006) que ao envolver-se em escândalo deixa o cargo, assumindo Guido Mantega (2006-2010 – governo Lula e 2010-2015 governo Dilma). Em 2015, Dilma ensaia uma aproximação com o mundo das finanças ao indicar Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda. A turbulência política forçou a troca para Nelson Barbosa (dez/2015). Esta oscilação na condução da economia do País resultou na falta de confiança no mercado. Por outro lado, a constante instabilidade política leva à percepção de falta de segurança jurídica para dar estabilidade às relações econômicas.
Como apontam as agências de risco, o fator mais importante na composição deste quadro desolador da economia é a própria condução governamental. A solução não está apenas na troca de titulares de cargos, mas na adoção de políticas públicas seguras e confiáveis que tragam ao mercado um sentido de estímulo à produção. Por outro lado, a sociedade anseia por políticas conciliadoras e de respeito aos investimentos. Enquanto persistirem políticas de desconfiança com a classe produtora e de desafios às leis de mercado, não haverá saída para o caos atual. Mais do que nomes e partidos o que está em jogo é o modelo econômico a ser seguido.





[1] Em economia, doença holandesa (do inglês Dutch disease) refere-se à relação entre a exportação de recursos naturais e o declínio do setor manufatureiro. A abundância de recursos naturais gera vantagens comparativas para o país que os possui, levando-o a se especializar na produção desses bens e a não se industrializar ou mesmo a se desindustrializar - o que, a longo prazo, inibe o processo de desenvolvimento econômico..

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